Queda do preço do bitcoin pode ser considerada normal, já que criptomoeda teve valorização de 1.700% apenas em 2017
Por Vinicius Pereira
1 jun 2018, 07h01
Em dezembro do ano passado, o médico Daniel Toledo, 31, recebeu uma mensagem em um grupo de um famoso aplicativo de celular. Nela, um dos integrantes apresentava o investimento que prometia retornos estratosféricos em um curto período de tempo: o bitcoin. Toledo não teve dúvidas e seguiu os passos do amigo. Insatisfeito com o rendimento tímido que tinha em um CDB (Certificado de Depósito Bancário), sacou logo os cerca de 30 mil reais que estavam no investimento conservador. Abriu então uma conta em uma corretora que negociava a criptomoeda e alocou seu dinheiro no novo sucesso do momento.
“Não sabia muito bem do que se tratava. Obviamente, li a respeito, mas não conhecia o mercado. [O investimento] foi mais no susto mesmo, por achar que estava perdendo a oportunidade de ter um retorno muito alto e rápido”, conta ele.
Mas, o hit do verão esfriou e não rendeu aquilo que o integrante do grupo prometeu para esses investidores tardios. A desvalorização fez o bitcoin, uma das chamadas moedas digitais negociadas da internet, perder mais de 50% do seu preço desde então.
Naquele mês de dezembro, a criptomoeda registrou uma cotação histórica, atingindo incríveis 19.343 dólares a unidade (72.278 reais). Nesta quarta-feira, a moeda chegou a 7.292 dólares (27.248 reais) – menos da metade do que valia no último mês do ano passado.
O médico, contudo, não foi o único que agiu às pressas e agora não sabe o que fazer. Os últimos meses de 2017 tiveram um verdadeiro ‘efeito manada’ em relação ao ativo. As duas principais corretoras do Brasil registraram enorme crescimento na base de clientes e nos montantes movimentados por aqui.
A corretora Mercado Bitcoin, por exemplo, saltou de 200 mil clientes no início do ano passado para um milhão no início deste ano. Já a Foxbit, outra grande corretora brasileira, passou de 50 mil clientes e cerca de sete funcionários para 400 mil clientes e 75 colaboradores. Para efeito de comparação, em abril, último dado disponível, a B3, a bolsa de valores brasileira, contava com 663 mil clientes pessoas físicas, que investem em inúmeras empresas lá listadas.
“Em uma quarta-feira do mês de dezembro, a gente negociava 20 milhões de reais e logo no dia seguinte negociamos 140 milhões de reais. Foi um crescimento absurdo em muito pouco tempo. O bitcoin era matéria em muitos portais e fazia muita gente sem conhecimento entrar para tentar ficar rico. Isso fez muita gente comprar no topo”, conta Guto Schiavon, sócio-fundador da FoxBit.
Essa corrida iniciada em dezembro, inclusive, não é vista como positiva pelas corretoras dado os problemas causados por investidores sem experiência e com um volume muito alto. Por isso, elas já pensam em criar plataformas para oferecer educação financeira a quem quiser investir.
O que fazer agora?
Com tanta gente correndo para entrar em algo que não conheciam e que viria a cair, o resultado é meio óbvio. Quem entrou antes, por exemplo, ainda continua no lucro. Mas, após o efeito manada, a maioria dos investidores vem perdendo dinheiro e agora não sabe o que fazer com as frações de bitcoin compradas.
Antes de mais nada, contudo, é necessário entender que o bitcoin e as demais criptomoedas são considerados ativos de alto risco e extremamente voláteis. Dessa forma, podem subir muito (e cair muito também) em um curto período de tempo.
Segundo especialistas consultados por VEJA, a queda do preço do bitcoin pode ser considerada normal. Apenas em 2017, ele subiu cerca de 1.700% e, por isso, uma correção já era esperada.
“Para o bitcoin pouquíssima coisa mudou. No final do ano passado houve um efeito manada e uma hora corrige [o valor]. Mas, se pegar termos técnicos, nada aconteceu. Só uma variação de mercado meio tradicional”, diz Schiavon.
Além da correção natural, o mercado de criptomoedas em geral também enfrentou contestações e problemas de regulação em países como China e Coreia do Sul. No Brasil, por exemplo, a CVM (Comissão de Valores Mobiliários, que regula o mercado financeiro) proibiu fundos de investimento de alocar recursos em tal ativo.
Mesmo com os problemas que vem enfrentando e a perda de valor recente, o importante é que cada investidor procure entender como funciona o ativo e, a partir daí, trace uma estratégia para obter ganhos ou, ao menos, diminuir as perdas.
“Cabe a avaliação por parte de cada investidor. Eu não vejo nada que possa explicar a volta do patamar [histórico]. Se eu fosse apostar no cenário, seria a estabilização. A partir do momento que ela [a criptomoeda] tiver maturidade suficiente, com oferta e demanda, e não apenas para especulação, aí o cenário pode mudar”, afirma Caio Villares, presidente da Ancord (Associação Nacional das Corretoras e Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários, Câmbio e Mercadorias)
Para André Perfeito, economista-chefe da Spinelli Corretora, o bitcoin pode até se beneficiar como investimento alternativo graças a instabilidade dos mercados tradicionais. Assim, quem investiu lá atrás deve pensar em segurar o ativo por mais tempo. Além disso, para o economista, essa corrida ao bitcoin pode ajudar o brasileiro a, finalmente, entender um pouco mais sobre o mercado em um momento em que as taxas de juros são menores e, assim, investimentos conservadores não rendem tanto.
“O brasileiro está muito pouco habituado ao mercado de capitais. Acho que o bitcoin pode servir de porta de entrada para esse poupador conhecer melhor. Se de um lado havia muita fantasia sobre o bitcoin, talvez as corretoras ajudem no início da educação financeira do brasileiro”, diz ele.
Não à toa, as empresas que comercializam bitcoin passaram a oferecer cursos para explicar melhor aos investidores o funcionamento e os riscos de cada investimento. “A gente está fazendo uma série de vídeos de educação [financeira] pois estamos realmente preocupados em divulgar isso”, afirma Luiz Roberto Calado, economista-chefe do Mercado Bitcoin. “Reconhecendo que é algo novo, é da nossa responsabilidade esclarecer que há riscos. Por isso educamos para eles entenderem que existe uma volatilidade e que o preço pode oscilar”, completa.